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“Quem deveria estar nos protegendo, está nos matando”. Confira nossa entrevista com Abronca

Conhecidas no mundo inteiro desde quando ainda se chamavam Pearls Negras, as MCs My e Jay, da dupla Abronca, trocaram uma ideia com o RapRJ. Depois de lançarem a releitura da faixa 174, em clipe dirigido por Taylan Mutaf, as rappers prometem diversas novidades neste ano, inclusive um álbum colaborativo. Confere aí o papo que rolou na entrevista.



– “174” é uma faixa que questiona a culpa das mortes de pessoas pretas e periféricas, como os casos de Sandro Barbosa e Marielle Franco. Como evitar que mais casos assim aconteçam?

My – Com um melhor preparo e treinamento da polícia militar para as favelas e periferias. Acredito que o preconceito e racismo já vêm enraizados dali! E enquanto moradores forem confundidos por cor e por serem favelados, muitas famílias inocentes vão chorar.
Não vejo melhoria na segurança, vejo genocídio do povo preto e periférico, abuso da autoridade! Enquanto o pensamento for “bandido bom é bandido morto”, nessa guerra muitos inocentes vão morrer. A cada 23 minutos morre um jovem negro no Brasil e quem deveria estar nos protegendo está nos matando.

– A letra é uma composição do pai da My, cantor e compositor conhecido como Tadi. Como foi esse processo criativo  e qual a importância do apoio da família a jovens artistas como vocês?

My – Meu pai escreveu essa música há 20 anos atrás, inspirado  no acontecimento do 174! Temos o grupo desde 2010 e, assim que começamos as aulas de rima, ele nos presenteou com esse som. A partir daí, sempre cantamos ela em nossos shows, e com o passar dos anos a gente adaptou ela pro caso Marielle. Infelizmente, mesmo sendo uma música tão antiga, o cenário não mudou.
Acredito que o apoio da família é fundamental no crescimento e encorajamento do artista. Nossos familiares sempre nos estimularam a seguir. Isso foi o mais significante pra nós. Ter a base de quem amamos nos faz crescer e permanecer no sonho!

– O videoclipe tem direção do turco naturalizado inglês Taylan Mutaf, que vocês conheceram durante turnê internacional. Como aconteceu essa parceria? Destacam alguma diferença entre o trabalho e a abordagem dele em relação aos diretores brasileiros?

Jay – Em 2014 e 2015, tivemos a oportunidade de sair do Brasil, graças ao David e o Ian da gravadora Bolabo Records. Ainda éramos Pearls Negras e fizemos duas turnês internacionais. Foi através do Festival de Glastonbury, na Inglaterra, que conhecemos o Taylan. Ele pediu pra nos acompanhar fazendo gravações da turnê, e ele vem nos acompanhando até hoje.
Hoje em dia, ele está em criação de um documentário nosso, onde ele tem tudo registrado da nossa carreira, desde essa época. Tem altos e baixos, mudanças, brigas, momentos importantes. Creio que no final de tudo teremos um lindo documentário mostrando a realidade do Abronca e toda a nossa caminhada. 
O Taylan trabalha com documentários, vai de país em país mostrando diversas culturas, classes e vidas diferentes. Por isso a abordagem dele em relação ao clipe “174” ficou tão forte e verdadeira. Ele quis mostrar toda a realidade, toda injustiça. A visão dele como diretor é muito sincera e realista.

 – Quais as principais referências musicais que inspiram vocês?  

Jay – Nossas principais referências músicas vem de cantores e cantoras que passam a verdade em suas músicas. No R&B, tem a Beyoncé, a Rihanna, etc.
No Rap nacional, nos inspiramos muito no Djonga, no BK, no Emicida, na Drik Barbosa, entre outros. Na MPB, nos inspiramos muito no Djavan, no Seu Jorge. No funk, nos inspiramos muito na Ludmilla e no pop, a Iza. Temos muita referência de pessoas negras que levamos como espelho, nos identificamos muito com o som de todos eles.

– Como enfrentam o machismo na cultura hip-hop? Acham que os MCs da nova escola estão respeitando mais as mulheres?

My – Acredito que o machismo na cena hip-hop veio enraizado. Porém, desde pequena tivemos grandes referências que nos inspiraram e abriram caminhos, como Dina Di, Negra Rê, Kamilla Cdd, Negra Li, entre outras… Não gosto da ideia de sermos colocadas a “prova” pra saber se somos realmente boas ou não, ou sermos comparadas umas com as outras o tempo todo.
Parece que o espaço da mulher na cena do rap é seletivo. Porém, vejo muitos apoiando e ajudando no trampo. Acredito que haja mais respeito com o trabalho, porém tem muita coisa pra evoluirmos ainda! 

– Vocês começaram na arte com oficinas realizadas no Grupo Nós do Morro. Qual foi a importância do projeto na carreira artística de vocês?

Jay – Somos muito gratas ao Nós do Morro, não apenas por moldar a nossa carreira, mas também por nos transformar em seres humanos melhores. Foi lá que a gente se encontrou, que a gente se descobriu capaz. O Nós do Morro nos tirou da “bolha” em que vivíamos, e abriu os nossos olhos pro mundo. Muito obrigado Guti, Fátima, e todos os professores que nos ensinaram a amar o próximo, a aceitar as diferenças, a ter educação, e respeito. Somos muito gratas, de verdade. 

– O que planejam daqui pra frente? Pretendem lançar novos singles, clipes ou um disco ainda em 2020?

Jay – Esse ano está sendo um ano difícil, ainda mais para nós artistas que trabalhamos independentes. Pretendemos lançar muito conteúdo bom pra vocês, temos muitas músicas novas, roteiros de clipes, feats e um álbum colaborativo de 10 músicas para serem lançadas esse ano. Acredito que vamos conseguir mostrar pra vocês quem realmente somos com esse álbum. Espero que 2020 seja um ano próspero e produtivo. 

– O que mudou no trabalho de vocês após a pandemia do Coronavírus?

My – Tínhamos alguns planos de gravação, planejamento de shows, e isso acabou tendo que ficar de segundo plano. Porém, nos mantemos criativas e estamos compondo muito e planejando coisas pra fazer pós-quarentena. E tendo ideias pra manter nosso público ativo e entretido de outras maneiras via internet!

– Se pudessem fazer um feat com alguém no Brasil, quem escolheriam?

Jay – Minha meta de carreira é fazer um feat com a Mc Rebecca ou a Ludmilla. E da galera do rap nacional, queria muito fazer um feat com o FBC, Mazin, Cris Mc, Ebony, Sant e o Djonga por me identificar com eles como pessoas, além de artistas.
My – Acrescentando a resposta da Jay, na cena do rap nacional eu adoraria ter um feat com o MC Marechal. Sempre foi referência pra mim. Me inspira muito!

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